Sou só eu ou estamos em estado de tensão? E eu não estou falando de uma tensão normal. Estou falando de um permanente estado de alerta, receio, expectativa. Dia desses precisei estimar meu nível de stress de 1 a 10. Boa pergunta… fazia tempo que eu não parava com calma pra pensar nisso. Dei 7, mas podia ter sido 8.
Não sei se é a idade adulta que faz com que a gente passe a entender melhor as situações, e a gravidade de muitas delas.
Não sei se é o fato de que medimos o mundo pelos nossos olhos de hoje, então nossa experiência tem sempre mais peso do que as do passado.
Não sei se foi a pandemia que disparou em todos nós um alarme de que algo muito terrível pode acontecer a qualquer momento. Afinal, todos nós vivenciamos o lockdown, desemprego, desabastecimento, distanciamento, uma realidade nova em questão de dias.
Não sei se pela escalada de violência que vemos no noticiário, nos vídeos feitos dentro de aviões, estádios, shows, congresso nacional, etc. O discurso de nós contra eles cada vez mais acentuado, seja em QUALQUER discussão. Todos têm uma opinião sobre tudo e todos. A divergência tem que acabar em briga, cancelamento, ameaça…
Já reparou que qualquer coisa é motivo para amar ou odiar? E que naturalmente a questão “de que lado você está” é colocada pra nós?
Ainda ontem resolvi almoçar às 15h e sentei calmamente numa cafeteria para tomar um chá e comer um sanduíche. Escolhi o chá “tranquilidade” torcendo pra que ele me trouxesse alguma. Eu ia pegar o celular enquanto esperava, mas resolvi pegar um livro da estante. Dar uma pausa na tela depois de 2h de reunião online.
Li só um pouquinho e deixou com gosto de quero mais.
O livro trata das versões de diversas culturas para o mistério da Criação, até desembocar na explicação da ciência moderna para o surgimento do Universo. No tempo da refeição não consegui ler mais do que 30 páginas, mas teve um ponto que me chamou a atenção. Nossa forma de ver o mundo como par de opostos é o que faz ser tão difícil entender o inexplicável e então o mito da criação (que está presente em todas as culturas e religiões) é a ponte que liga o explicável ao inexplicável.
Explicar nosso mundo pelos opostos é uma forma muito criativa e fácil. Veja: dia ou noite, quente ou frio, oriente ou ocidente, amor ou ódio, e por aí vai. Acontece que essa forma de ver não deixa espaço para aquilo que nós ainda não conhecemos, para o que não entendemos, para o que não enxergamos. A sutileza, o espectro, a alternativa.
Eu entendo que quando estamos na chamada zona cinzenta, algo que não é lá nem cá, sentimos desconforto, meio perdidos, sem referência. Mas pensando por outro lado, ter sempre que escolher um lado nos aprisiona. O limite nos fecha pra muitas possibilidades.
Eu tenho uma crença (limitante) que é a de que uma vez que eu formei uma opinião sobre algo, eu não deveria mudá-la. Ou mesmo que eu mude, eu estaria fazendo algo errado. Foi algo que me dei conta há pouco tempo. O problema é que estou me limitando com opostos: o que eu acredito x aquilo que não conversa com o que acredito. E não haveria nada mais ali no meio. Ou pior, mesmo que eu estivesse errada eu teria que estar certa, apenas para reforçar essa crença.
Nossa mente é de uma complexidade tamanha!
Num outro livro muito interessante (esse eu li todo!) “O Caibalion: Estudo da filosofia hermética do antigo Egito e da Grécia” os três iniciados explicam o princípio da polaridade:
“Tudo é Duplo; tudo tem polos; tudo tem o seu oposto; o igual e o desigual são a mesma coisa; os opostos são idênticos em natureza, mas diferentes em grau; os extremos se tocam; todas as verdades são meias-verdades; todos os paradoxos podem ser reconciliados”.
Agora veja aqui o pulo do gato. O igual e o desigual são a mesma coisa. O que os difere é o grau. Ou seja, quente e frio são graus de calor, mais ou menos calor. Extremos de uma mesma coisa. Já dizia o velho ditado: a diferença entre o remédio e o veneno é a dose.
Isso muda muito. Isso nos aproxima ao invés de afastar, pois faz com que entendamos que aquele que discorda de nós, acredita mais ou menos do que nós sobre a mesma coisa. E que muita discussão simplesmente não leva a nada.
Afinal, achar que o que a gente sabe da vida é tudo o que tem pra se saber, é muita arrogância.
Ah… o alívio de reconhecer que tem coisas que a gente não sabe. E mais, não só sabe como não tem a obrigação, não é mesmo?
Ganhamos quando entendemos que nossas convicções devem nos fortalecer e não nos aprisionar, que a polaridade é boa quando não nos afasta e que devemos escolher as batalhas que merecem ser travadas. Talvez esse combate, muitas vezes invisível, mas sempre tenso, pode ser acalmado quando enxergarmos o outro como alguém não tão distante de nós.